A sustação de protesto de títulos de crédito devido à crise ocasionada pelo Coronavírus

Notícias, 07/05/2020

Um expediente comum no dia a dia das relações comerciais é a cobrança de débitos por meio do protesto de títulos inadimplidos. O protesto é instrumento de prova para a promoção da ação de execução do título e, de maneira imediata, capaz de coagir o devedor ao pagamento por meio da restrição de seu crédito.

Como meio de defesa do protesto é possível ao protestado promover pedido judicial de sustação do protesto, no caso que o título tenha sido apresentado e ainda não realizado o protesto, ou sustação dos efeitos do protesto caso este tenha sido perfectibilizado. O pedido se caracteriza por ser uma tutela cautelar atípica que pode ser solicitada de maneira antecedente ou incidental.

Na fundamentação para a concessão da tutela, o protestado deve comprovar a probabilidade de seu direito e o perigo de dano. O primeiro requisito consiste no mérito de sua defesa que deve versar sobre situação específica que desconfigura o direito do credor de protestar ou cobrar os valores protestados. Quanto ao segundo requisito, deve demonstrar o protestado os danos que o protesto lhe irá impor caso seja levado a efeito.

Além disso, considerando que a sustação do protesto é medida que causará gravame ao credor, deve o protestado apresentar caução suficiente para garantia do crédito, sob pena de indeferimento do pedido de sustação. 

O novo cenário econômico originário da COVID-19

Atualmente o mundo é atingido por uma pandemia que tem causado uma grave crise humanitária com grande impacto nas relações comerciais e mudado hábitos de consumo. Trata-se de um novo cenário em que se insere a atividade comercial.

Diante da situação, o Estado tem adotado uma postura interventiva na economia a fim de evitar ou, ao menos, diminuir a propagação da doença. São adotadas medidas que acabam restringindo a capacidade de produção e comercialização, a qual se exemplifica pela limitação de clientes no estabelecimento, distanciamento mínimo, utilização de máscaras, proibição de circulação de transporte público e atividades escolares.

Junto disso, e em decorrência da crise, o nível de confiança do consumidor atingiu seu nível mais baixo desde o ano de 2005. É um efeito natural causado pelo medo de perda da renda e a necessidade de manutenção do distanciamento social para diminuição da propagação da doença.

Para a atividade comercial e industrial, os primeiros efeitos sensíveis da nova crise são as solicitações de cancelamento e adiamento de pedidos, impactando na cadeia de pagamentos de fornecedores e, consequentemente, acarretando no protesto de títulos de crédito.

Contudo, é de se ressaltar nesse novo cenário econômico a necessidade da busca pelo diálogo, buscando-se a conciliação a fim de renegociar débitos ou, possivelmente, determinar novas datas de vencimento.

A sustação de protesto como tutela do crédito no momento de crise – revisão dos negócios jurídicos

Diante da crise, a sustação de protesto como tutela do crédito toma maior relevância no meio jurídico em vista da necessidade da busca por empréstimos e financiamentos para a manutenção da atividade empresarial. Não se trata de tutelar investimentos, mas sim da obtenção de meios para cobrir custos com trabalhadores e insumos para garantir o mínimo de fluxo comercial.

Assim, é possível admitir a tutela do crédito como forma de política pública, principalmente de manutenção do emprego e da renda, garantindo por um lado o mínimo existencial do cidadão e de outro o equilíbrio fiscal dos governos ao diminuir o número de dependentes de auxílios assistenciais. Não tutelar o crédito seria admitir a paralisação do consumo, um aumento exponencial no índice de desemprego e a chegada de um grande número de processos de recuperação judicial e falências que, naturalmente, vão sobrecarregar o sistema.

Nesse quadro se insere a possibilidade do debate acerca da dos efeitos do protesto que, sem dúvidas, é um dos instrumentos mais utilizados para cobrança e que inegavelmente restringe a concessão de crédito pelas instituições financeiras.

Em prol dessa tutela o poder legislativo tem atuado com a edição de leis que regulamentam as relações jurídicas neste momento de transição. Em específico, às relações privadas, tramita no congresso nacional a PL 1.179/2020 que prevê alterações de prazos prescricionais e possibilidades de revisão contratual.

No entanto, ainda ausente legislação específica, o próprio Código Civil fornece instrumentos que possibilitam a releitura/revisão dos negócios jurídicos que culminam no protesto e execução de títulos de crédito. Dentre esses se destacam a onerosidade excessiva, a exceção de contrato não cumprido, a exceção de inseguridade e a observância dos princípios da boa-fé e função social do contrato.

Assim, quando da impossibilidade de negociação ou recusa injustificada do credor em estabelecer o diálogo, somada a comprovada dificuldade do devedor diante do cancelamento e adiamento de pedidos pela pandemia da COVID-19, é possível lançar mão de meios para buscar o reequilíbrio contratual e, além disso, questionar a realização do protesto e a manutenção de seus efeitos.

A sustação de protesto aplicada na Vara Civel de Brusque

Foi esse o entendimento aplicado em recente decisão oriunda da Vara Civel de Brusque, que considerando a situação da pandemia em conjunto com a boa-fé contratual do Devedor, deferiu tutela de urgência que pleiteava a suspensão dos efeitos do protesto por 60 dias.

Verifica-se que, com a decisão da sustação de protesto, não se está a declarar a inexistência da dívida, nem tampouco a liberar o Devedor dos demais efeitos da mora, como o pagamento de juros moratórios, por exemplo, mas adapta o contrato à situação atual, evitando que o título seja levado a protesto, permitindo que o Devedor possa ter acesso a crédito e com isso, busque a recuperação financeira de seu negócio.

Confira também a nova lei sobre Negociação de Dívidas.

Autores: 
Sergio Luis Muller Junior
Rafael Niebuhr Maia de Oliveira
 
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